É uma historia do livro
Os Contos de Beedle, o Bardo
da J.K. Rowling
BABBITTY, A COELHA, E SEU Toco GARGALHANTE
Há muitos e muitos anos, em uma terra muito
distante, vivia um rei apalermado que decidiu que somente ele devia ter poderes
mágicos.
Assim, ordenou que o
chefe do seu exército formasse uma Brigada de Caçadores de Bruxos, e equipou-a
com uma matilha de ferozes cães negros.
Ao mesmo tempo,
determinou que em cada aldeia e cidade de suas terras fosse lida a seguinte
proclamação: "O rei procura um Instrutor de Magia."
Nenhum bruxo ou
bruxa ousou se candidatar ao cargo, pois estavam todos escondidos da Brigada de
Caçadores de Bruxos.
Entretanto, um
astucioso charlatão, sem qualquer poder mágico, viu nisso uma chance de
enriquecer e apresentou-se ao palácio como um bruxo de enorme perícia. O
charlatão executou alguns truques simples que convenceram o rei dos seus
poderes mágicos, e foi imediatamente nomeado Grande Feiticeiro-Chefe, Mestre
Régio de Magia.
O charlatão pediu ao
rei que lhe desse um polpudo saco de ouro para ele poder comprar varinhas e
outros materiais mágicos necessários. Pediu, ainda, vários rubis graúdos para
serem usados no lançamento de feitiços curativos e uns dois cálices de prata
para guardar e maturar poções. Tudo isso o apalermado rei lhe
entregou.
O charlatão guardou
o tesouro a salvo em sua própria casa e voltou aos jardins do palácio.
Ele não sabia, no
entanto, que estava sendo observado por uma velha que vivia em um casebre na
periferia dos jardins do palácio. Seu nome era Babbitty, e ela era uma
lavadeira que mantinha as roupas de cama e mesa do palácio macias, cheirosas e
alvas. Espreitando por trás dos lençóis que secavam no varal, Babbitty viu o
charlatão partir dois galhinhos de uma das árvores do rei e desaparecer no
interior do palácio.
O charlatão entregou
um dos gravetos ao rei e lhe garantiu que era uma varinha de formidável poder.
— Mas somente
produzirá resultados — disse o charlatão — quando o senhor se mostrar
merecedor.
Toda manhã o
charlatão e o apalermado rei saíam aos jardins onde agitavam suas varinhas e
bradavam disparates para o céu. O charlatão tinha o cuidado de executar mais
truques, de modo a manter o rei convencido da perícia do seu grande feiticeiro
e do poder das varinhas que tinham lhe custado tanto ouro.
Certa manhã, quando
o charlatão e o rei apalermado faziam floreios com suas varinhas, pulavam em
círculos e entoavam rimas sem sentido, uma grande gargalhada chegou aos ouvidos
do rei. Babbitty, a lavadeira, apreciava o rei e o charlatão da janela de sua
casinha, e gargalhava com tanto gosto que não tardou a desaparecer de vista,
fraca demais para continuar de pé.
— Devo parecer muito
indigno para fazer a velha lavadeira dar tantas risadas — disse o rei. Ele
parou de pular e agitar a varinha e enrugou a testa.
- Estou cansado de
praticar! Quando estarei pronto para realizar feitiços régios diante dos meus
súditos, feiticeiro?
O charlatão tentou
tranquilizar seu discípulo, assegurando-lhe que logo seria capaz de feitos
mágicos surpreendentes. Porém, as gargalhadas de Babbitty incomodaram o rei
mais do que o
charlatão imaginava.
— Amanhã — disse o
rei —, convidaremos nossa corte para assistir ao seu rei realizar mágicas!
O charlatão viu que
chegara a hora de apanhar seu tesouro e fugir.
Ai
de mim, será impossível! Esqueci-me de informar Vossa Majestade que preciso
sair amanhã em uma longa viagem...
Se
você deixar este palácio sem a minha permissão, feiticeiro, minha Brigada de
Caçadores de Bruxos o perseguirá com os seus cães! Amanhã de manhã você me
ajudará a realizar mágicas diante dos nossos lordes e damas, e se alguém rir de
mim, mandarei decapitá-lo!
O rei entrou enfurecido
no palácio, deixando o charlatão só e amedrontado. Agora nem toda a sua astúcia
seria capaz de salvá-lo, pois não poderia fugir nem tampouco ajudar o rei com a
magia que nenhum dos dois conhecia.
Procurando uma
válvula para aliviar seu medo e raiva, o charlatão se aproximou da janela de
Babbitty, a lavadeira. Espiando para dentro da casa, viu a velhinha sentada à
mesa, encerando uma varinha. Em um canto às suas costas, os lençóis do rei
estavam se lavando sozinhos em uma tina de madeira.
O charlatão compreendeu imediatamente
que Babbitty era uma bruxa genuína, e que, tendo lhe causado aquele terrível
problema, poderia também resolvê-lo.
— Sua bruxa velha! — berrou o
charlatão. — Sua gargalhada me custou caro! Se não me ajudar, vou denunciá-la,
e você é que será despedaçada pelos cães do rei!
A velha Babbitty sorriu para o
charlatão e tranquilizou-o, dizendo que faria tudo em seu poder para ajudá-lo.
O charlatão lhe deu instruções para
se esconder em uma moita enquanto o rei apresentava o seu espetáculo de magia,
e para
executar os feitiços
do rei sem que ele soubesse. Babbitty concordou com o plano, mas fez uma
pergunta.
— E, meu senhor, se o rei tentar um
feitiço que Babbitty não seja capaz de realizar?
O charlatão zombou.
— A sua mágica é superior à
imaginação daquele tolo — garantiu-lhe o homem e se retirou para o castelo
muito satisfeito com a própria esperteza.
Na manhã seguinte todos os lordes e
damas do reino se reuniram nos jardins do palácio. O rei subiu a um palco à
frente deles acompanhado pelo charlatão.
— Primeiro, farei o chapéu dessa dama
desaparecer! — anunciou o rei, apontando o seu galhinho para uma dama.
Do meio de uma moita
próxima, Babbitty apontou a varinha para o chapéu e o fez sumir. Grande foi o
espanto e a admiração da nobreza e forte o seu aplauso para o jubiloso rei.
— A seguir, farei
aquele cavalo voar! — anunciou o rei, apontando o galhinho para o próprio
ginete.
Do meio da moita,
Babbitty apontou a varinha para o cavalo e o animal se elevou no ar.
Os nobres ficaram ainda mais arrebatados e
surpresos, e, aos gritos, manifestaram o seu apreço pelo rei mágico.
—
E, agora — disse o rei, correndo o olhar ao redor em busca de uma idéia; e o
capitão de sua Brigada de Caçadores de Bruxos correu para o rei.
- Majestade — disse
o capitão — esta manhã, Sabre morreu depois de comer um cogumelo venenoso!
Ressuscite-o , majestade, com a sua varinha!
E o capitão carregou
até o palco o corpo sem vida do maior dos cães caçadores de bruxos.
O apalermado rei
brandiu o seu galhinho e apontou para o cão morto. Mas, no meio da moita,
Babbitty sorriu, e não se deu sequer o trabalho de erguer a varinha, porque
nenhuma mágica é capaz de ressuscitar os mortos.
Ao ver que o cão
continuava imóvel, os nobres começaram primeiro a murmurar e depois a rir.
Desconfiaram que os
primeiros dois feitos do rei, afinal, não tinham passado de simples truques.
Por que não está
funcionando? — gritou o rei para o charlatão, que recorreu ao último ardil que
lhe restava.
Ali, majestade, ali!
— gritou ele, apontando para a moita onde Babbitty estava escondida. — Vejo-a
claramente, a bruxa má que está bloqueando a nossa magia com os seus próprios
feitiços malignos! Prenda-a, alguém, prenda-a!
Babbitty fugiu da moita, e a Brigada de
Caçadores de Bruxos saiu em sua perseguição, soltando os cães, que latiram
longamente, sedentos pelo sangue da bruxa. Mas, ao alcançar uma sebe baixa, a
bruxa desapareceu de vista, e quando o rei, o charlatão e todos os cortesãos
chegaram ao outro lado, encontraram a matilha caçadora latindo e
escarafunchando ao redor de uma árvore velha e curvada.
— Ela se transformou
em uma árvore! — berrou o charlatão e, temendo que Babbitty retomasse sua forma
humana e o
denunciasse,
acrescentou:
— Derrube-a, Vossa
Majestade, é assim que se lida com bruxas más!
Imediatamente
trouxeram um machado, e a velha árvore foi abatida com sonoros vivas dos
cortesãos e do charlatão.
Entretanto, quando
se preparavam para retornar ao palácio, o som de uma gargalhada os fez parar de
estalo.
Tolos!
— exclamou a voz de Babbitty do toco que eles haviam deixado para trás.
Bruxos
e bruxas não podem ser mortos rachando-os ao meio! Se não acreditam em mim,
peguem o machado e cortem o grande feiticeiro ao meio!
O
capitão da Brigada de Caçadores de Bruxos se apressou a fazer a experiência,
mas, quando ergueu o machado, o charlatão caiu de joelhos pedindo misericórdia
e confessando toda a sua maldade. Ao vê-lo sendo arrastado para a masmorra, o
toco de árvore gargalhou mais alto que nunca.
— Quando cortou uma bruxa ao meio, Vossa
Majestade desencadeou uma terrível maldição sobre o seu reino! — disse o toco
ao rei aterrorizado. - De hoje em diante, cada maldade que o senhor infligir
aos meus companheiros bruxos se refletirá como uma machadada do lado do seu
corpo, até o senhor desejar morrer.
Ao ouvir isso, o rei
também caiu de joelhos e disse ao toco que faria imediatamente uma proclamação,
protegendo todos os bruxos do seu reino e deixando-os praticar sua magia em
paz.
Muito
bem — disse o toco —, mas o senhor ainda não compensou Babbitty!
Farei
qualquer coisa, qualquer coisa que pedir! — exclamou o apalermado rei, torcendo
as mãos diante do toco.
- O senhor construirá uma estátua de
Babbitty em cima de mim, em memória da sua pobre lavadeira, para lembrá-lo para
sempre de sua própria tolice! — ordenou o toco.
O rei concordou imediatamente e prometeu
contratar o maior escultor da terra para fazer uma estátua de ouro puro. Depois
o
envergonhado rei e
toda a nobreza retornaram ao palácio, deixando o toco dando gargalhadas às suas
costas.
Quando os jardins se
esvaziaram novamente, esgueirou-se do buraco entre as raízes do toco uma velha
coelha robusta e bigoduda com uma varinha presa entre os dentes. Babbitty saiu
saltando pelos jardins para muito longe, a estátua de ouro da lavadeira, que
recobria o toco, durou para sempre, e nunca mais os bruxos foram perseguidos
naquele reino.
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